segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Mais um texto baseado em uma imagem. Porém, ao contrário da postagem anterior, quando as palavras buscavam criar a imagem, neste texto abaixo, a imagem deu vasão às palavras. O processo criativo, neste caso, parte de dentro para fora, buscando uma história que justifique a imagem alí exposta. Creio eu, que é o que fez Almada Negreiros com sua "Taça de Chá", já mencionada antes. É basicamente o oposto que fazem os jornais, que mandam os artigos para seus ilustradores, que, baseados no que conta a matéria, cria uma imagem que a acompanhará. Vamos à história.



A Mulher Descalça




Logo à frente estão as pedras em forma de pirâmide, amontoadas por algum rio que passou por ali. À sua frente, as admira uma roseira que traz consigo seu belo troféu escarlate e um riacho que talvez seja filho daquele que juntou as pedras de forma tão minuciosa.


No bosque que as abriga, passeia a frágil mulher descalça, que ao vento demonstra total falta de pressa. De olhos fechados relembra os momentos da infância, quando, também descalça, ali brincava com a idosa senhora que a acompanhava. Ali corria, se molhava no riacho, voltava para a velha e se sentava sobre a grama que cobre o chão, para um descanso e um rápido lanche. Depois do lanche voltava à correria assustando borboletas coloridas que fugiam como flores aladas. Ela se divertia.


Seguiam por todo o bosque assim. Paravam, descansavam, e voltavam ao caminho. A menina que agora caminha descalça, corria; a senhora que a acompanhava, seguia a passos breves que a outra agora imita.


O caminho era anunciado pelo leito do riacho e, chegada a metade da tarde, antes de se porem no caminho de volta, sentavam-se ao pé do pequeno monte de pedras, nas rochas mais baixas. Ali sentiam o vento nas faces, viam o colorido das borboletas e ouviam a o sussurro do riacho e o canto dos pássaros em algazarra. Permaneciam assim até a hora da volta.


Agora a mulher repete o gesto, descalça e a pequenos passos. À frente estão as pedras em forma de pirâmide, amontoadas por algum rio que passou por ali e a roseira que traz consigo o belo róseo troféu.


Ela se senta ao pé da pirâmide, levanta suavemente a barra do discreto vestido azul, e ali sente na face a pouca brisa que resta na cidade que rodeia o antigo bosque. Tenta ouvir, entre buzinas e motores, o sussurro do rio e o alarido dos pássaros. Borboletas já não há.


A mulher, então, abaixa a cabeça num gesto suave e estende a mão à roseira como se fossem irmãs. Por cima dos olhos dá uma olhada naquela singela presença entre pedras, fecha os olhos por um instante e, quase imperceptivelmente dá um sorriso confessando à planta que também trás na lembrança um troféu escarlate.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Sarjeta

A vista dos pés, um mostrando a sola nua e o outro o calcanhar levantado, dizia claramente que o rapaz corria. Em pé o senhor apertava desolado a face contra as duas mãos, sugerindo um movimento de negação e desespero. Diante do rapaz que corria, apenas a mureta do Ribeirão Arrudas, na parte central da Avenida do Contorno. Ao lado do homem que se desesperava, havia apenas o movimento das pessoas que embarcavam tranqüilamente nos ônibus que chegavam e partiam da rodoviária.
Ao pé do Elevado Castelo Branco, dois policiais, com olhares despreocupados, assistiam inertes à corrida do meliante. Diante deles uma criança suja dormia calmamente, enquanto bêbados dançavam ao som alto que vinha do bar ali na esquina.
Abaixo do menor que dormia, também jogada na sarjeta, pousava revoltada a assinatura do pintor.
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A título de filosofia da composição
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É certo que não existe texto original. Não, pelo menos, em sua essência. Todos os textos que produzimos, ainda que seja aparentemente uma grande novidade, carrega consigo uma série de informações que têm como origem diversos pensamentos de diversos autores. Toda conclusão é fruto de intercruzamentos de idéias que vamos colhendo ao longo de nossas vidas e nossas experiências.
Somos, a todo tempo, influenciados. O texto acima narra uma quadro que pode ou não existir. Embora eu não creia que algum artista melhor que eu tenha tido a idéia de pintá-lo, a imagem narrada retrata uma cena corriqueira de uma região central de Belo Horizonte. Não creiam, no entanto, que se trata de algo novo.
Na verdade já vi dois escritores mais renomados fazer o mesmo. Por coincidência (ou não) ambos portugueses. O primeiro foi Almada Negreiros, com sua "A Taça de Chá", no qual narra a estampa de uma taça de chá. O outro autor é José Saramago, nas páginas inicias do "Evangelho Segundo Jesus Cristo", onde narra a cena da crucificação.
Como podem perceber, nenhum texto é essencialmente inédito ou original. Comigo não seria diferente.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

A postagem abaixo, "Piada de Português", é na verdade de quinta-feira. Foi repostada na sexta, para resolver um problema técnico. Não tenho a pretenção de fazer uma postagem por dia. Sei que mais dia, menos dia, não terei tanta motivação e acabarei aumentando os intervalos entre uma história e outra. Um problema, aliás, que preciso corrigir. Vou deixar a título de postagem de sexta, para que seja curtido no final de semana, um texto que havia escrito para postar num outro blog meu que não consigo mais administrar. Foi escrito em comemoração do dia internacional das mulheres. Sem mais delongas.

A Mulher de Francisco

Existirá um significado misterioso para o fato de Deus ter feito a mulher após ao homem. Parece-me, de certo modo, um arrependimento, um ato de caridade divina Dele consigo mesmo, dando-se a oportunidade de tentar outra vez. Hoje, vendo os homens transitando sozinhos, levando sonhos e escritórios na cabeça, desconfio da simples intenção de dar uma companheira ao homem. Me é claro que Deus não ficara satisfeito com o resultado final de sua obra.
Eu sua nova empreitada, arredondou as formas, acrescentou um pouco de barro aqui, tirou um pouco de lá, projetou minuciosamente os trejeitos, os gestos e os olhares. Pegou emprestado de algumas das flores, que criara para enfeitar o Éden, graça e formosura e empregou-lhes na sua nova criação. Tirou das estrelas um pouco de luz e lhe pôs à face e pintou em aquarela um sorriso mágico. O Criador se superou e fez, então, sua obra prima.
Feita de belezas e poesia, logo que pisou no Paraíso foi reconhecendo a graça de tudo à sua volta, ao contrário de seu parceiro que buscava a caça. Ela não se aborreceu. De alguma forma, ao criar tais gestos e dar-lhe beleza e formosura, Deus acabou programando-a a burlar as certezas masculinas e, banhada em sutileza, o convencer a fazer aquilo que ela desejava.
E é graças a esses dons divinos que, séculos depois da criação celestial, Marta sorri na cama ao lado de Francisco que lê irritadamente um relatório financeiro da empresa.
- Amor, o que tem nesses papéis?
- É o relatório financeiro da empresa, tenho que fechar isso até amanhã. - Respondeu Francisco irritado.
- Mas amor, você já não ficou o dia todo trabalhando para resolver esses problemas. Agora é hora de outra coisa. Vem cá, vem?
- Não posso Marta, já disse tenho que resolver esse problema. - Mais irritado ainda.
- Ah, amor... - voz melosa. Isso não é hora de trabalhar, vem cá que vou fazer aquela massagem.
- Não vai ter jeito, né? - Perguntou se virando a ela, com o papel já meio de lado e total impaciência na voz.
- Claro que vai ter, amor. Vem cá que dou um jeito em você num instante.
- Ai meu saco! - pondo a mão na testa, já prevendo uma briga que estaria por vir.
- Está doendo também amor? Quer uma massagenzinha também. Eu cuido de você todo, coração.
Ele respirou fundo, olhou para o céu como quem pede uma orientação ou paz e disse entre dentes:
- Você não percebe que eu preciso terminar isso? Que não posso ficar de namorico?
Ela então respondeu sorridente: - Eu percebo que tenho meu amor na minha cama, estou aqui toda para ele e querendo que ele mate as vontades dele.
- Eu quero me enterrar - Disse ele, simulando um choro.
- Então vem meu homem, se enterra. - Retrucou Marta com voz sedutora, fazendo movimentos para seu lado e enrroscando suas pernas nas dele.
- Para de sacanagem, Marta!
- Nós nem começamos, meu amor. Vem cá, vem...
- Nem vamos começar. - Disse ele, levantando-se da cama e saindo do quarto com o tal relatório em direção à sala, onde passaria a noite a lê-lo.
Ela ficou inerte vendo-o sair. Segundos depois, levantou-se, foi até a porta para se certificar que ele de fato fôra para o sofá e retornou ao quarto, apagando a luz e dizendo:
- Vai pro inferno! Se vai passar a noite aqui, acordado, lendo essa merda de relatório, que pelo menos libere o melhor lado da cama.
E, enfim, dormiu.

Piada de Português


Nesta semana os auditores da Fifa deram um role pelo Brasil para estudar as cidades candidatas à sedes para a Copa do Mundo de 2014. BH entrou definitivamente na briga e órgãos públicos e privados firmaram promessas e mais promessas de modernização, a fim de adequar a cidade às exigências da Fifa. Todo esse esforço lembrou-me Tiradentes que dizia que se “todos quiséssemos faríamos deste país uma grande nação”. Quando querem, fazem.


BH conta com um grande estádio, que será todo remodelado para se transformar numa arena multiuso. Bacana! O metrô da cidade, que não passa de um trem urbano, deverá ter uma linha que integra o centro da cidade às imediações do estádio. A rede hoteleira, que alega já possuir uma quantidade satisfatória de leitos, promete, ainda assim, aumentar sua capacidade e melhorar seus serviços, para atender os mais exigentes turistas, que deverão vir à cidade, caso seja mesmo escolhida dentre as 12 sedes do mundial – o que me parece mais que definido.


Em entrevista a um programa de TV, acho que da Globo mas tanto faz, uma diretora de uma dessas associações de empresas ligadas ao trade turístico, prometia um trabalho intenso de reestruturação do setor de serviços na cidade, para atender a demanda de turistas. Dentre as idéias previstas para implantação do projeto, dizia que os funcionários do setor de atendimento aos turistas – leia-se taxistas, garçons, recepcionistas, policiais militares, guardas municipais, motoristas e cobradores de ônibus e etc. – deverão até o ano da copa dominar, pelo menos, o inglês e o espanhol. Acredito, claro!


“Nós fez”, “Nós foi”, “Nós ganho”, “a gente vamos”... será que alguém vai se lembrar da piada do português?

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Linha oCUpada

Aconteceu em um presídio de Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte: a esposa de um detento compareceu para uma visita íntima – pasmem! – acompanhada dos dois filhos do casal. Levantou suspeitas ao se recusar a fazer os procedimentos de segurança para essas visitas, que consiste, na prática, em uma revista geral. Na realidade ela se recusou se agachar nua, procedimento que, segundo os guardas, existe para evitar que visitantes entrem no presídio “portando” objetos em seus orifícios íntimos. A mulher, então, se retirou com suas proles e voltou depois, alegando que só aceitaria fazer os procedimentos acompanhada da Polícia Militar, sem a presença dos carcereiros. Mais suspeitas ainda foram levantadas depois que as policiais encontraram duas – eu disse duas – camisinhas no ânus da mulher. Pressionada ela confessou que tentara entrar da primeira vez portando um celular e uma quantidade de maconha em seu fiofó. Como viu que não conseguiria entrar “desovou” os objetos em um matagal próximo. Policiais foram até o local acompanhado da mulher, onde encontraram apenas o celular. Ela ainda aproveitou o ensejo para denunciar um esquema de corrupção dentro do presídio, no qual carcereiros recebem grana para passarem celulares de uma ala a outra da instituição penal.

Ainda estou me perguntando que tipo de maluco que, ao encontrar uma quantidade de maconha e um celular num matagal, leva apenas a maconha e deixa para trás o aparelho. A não ser que seja um daqueles aparelhos antigos, anal-lógicos, gigantes. Malditos jornais que não divulgam a marca e o modelo do aparelho.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Pensamento do dia

"A maquilagem diz-nos mais que o rosto." - Oscar Wilde