A Mulher de Francisco
Eu sua nova empreitada, arredondou as formas, acrescentou um pouco de barro aqui, tirou um pouco de lá, projetou minuciosamente os trejeitos, os gestos e os olhares. Pegou emprestado de algumas das flores, que criara para enfeitar o Éden, graça e formosura e empregou-lhes na sua nova criação. Tirou das estrelas um pouco de luz e lhe pôs à face e pintou em aquarela um sorriso mágico. O Criador se superou e fez, então, sua obra prima.
Feita de belezas e poesia, logo que pisou no Paraíso foi reconhecendo a graça de tudo à sua volta, ao contrário de seu parceiro que buscava a caça. Ela não se aborreceu. De alguma forma, ao criar tais gestos e dar-lhe beleza e formosura, Deus acabou programando-a a burlar as certezas masculinas e, banhada em sutileza, o convencer a fazer aquilo que ela desejava.
E é graças a esses dons divinos que, séculos depois da criação celestial, Marta sorri na cama ao lado de Francisco que lê irritadamente um relatório financeiro da empresa.
- Amor, o que tem nesses papéis?
- É o relatório financeiro da empresa, tenho que fechar isso até amanhã. - Respondeu Francisco irritado.
- Mas amor, você já não ficou o dia todo trabalhando para resolver esses problemas. Agora é hora de outra coisa. Vem cá, vem?
- Não posso Marta, já disse tenho que resolver esse problema. - Mais irritado ainda.
- Ah, amor... - voz melosa. Isso não é hora de trabalhar, vem cá que vou fazer aquela massagem.
- Não vai ter jeito, né? - Perguntou se virando a ela, com o papel já meio de lado e total impaciência na voz.
- Claro que vai ter, amor. Vem cá que dou um jeito em você num instante.
- Ai meu saco! - pondo a mão na testa, já prevendo uma briga que estaria por vir.
- Está doendo também amor? Quer uma massagenzinha também. Eu cuido de você todo, coração.
Ele respirou fundo, olhou para o céu como quem pede uma orientação ou paz e disse entre dentes:
- Você não percebe que eu preciso terminar isso? Que não posso ficar de namorico?
Ela então respondeu sorridente: - Eu percebo que tenho meu amor na minha cama, estou aqui toda para ele e querendo que ele mate as vontades dele.
- Eu quero me enterrar - Disse ele, simulando um choro.
- Então vem meu homem, se enterra. - Retrucou Marta com voz sedutora, fazendo movimentos para seu lado e enrroscando suas pernas nas dele.
- Para de sacanagem, Marta!
- Nós nem começamos, meu amor. Vem cá, vem...
- Nem vamos começar. - Disse ele, levantando-se da cama e saindo do quarto com o tal relatório em direção à sala, onde passaria a noite a lê-lo.
Ela ficou inerte vendo-o sair. Segundos depois, levantou-se, foi até a porta para se certificar que ele de fato fôra para o sofá e retornou ao quarto, apagando a luz e dizendo:
- Vai pro inferno! Se vai passar a noite aqui, acordado, lendo essa merda de relatório, que pelo menos libere o melhor lado da cama.
E, enfim, dormiu.
Nenhum comentário:
Postar um comentário